A militância insuportável dos iluministros

O Supremo Tribunal Federal, que deveria ser o guardião da Constituição, transformou-se em um dos protagonistas da crise institucional que corrói a democracia brasileira. A cada semana, decisões tomadas por seus ministros reforçam a nítida percepção de que já não se trata de uma corte constitucional, mas de uma arena política, onde o saber jurídico é muitas vezes substituído por narrativas de ocasião, alinhadas ao jogo de poder do momento.

O país presencia, com perplexidade, uma Corte que acumula erros crassos, afronta aos princípios básicos do Direito e se distancia de sua função primordial: assegurar a harmonia entre os poderes e a preservação das liberdades individuais.

É impossível ignorar a flagrante falta de rigor técnico que marca parte das decisões. Juízes constitucionais deveriam fundamentar seus votos na letra da Constituição, na jurisprudência consolidada e nos princípios do Estado de Direito. Contudo, observa-se uma tendência crescente de utilizar conceitos vagos, interpretações forçadas e até invencionices jurídicas para justificar posições essencialmente políticas.

Expressões como “democracia em risco” ou “defesa das instituições” são frequentemente usadas como muletas retóricas para respaldar decisões que extrapolam em muito os limites do texto constitucional.

O problema é que esse recurso não apenas fragiliza a legitimidade das sentenças, como também gera insegurança jurídica, uma vez que os critérios se tornam subjetivos e maleáveis conforme os interesses de ocasião.

A incompetência, nesse contexto, não é apenas técnica, mas também institucional. O STF perdeu a capacidade de exercer autocontenção, princípio essencial em uma democracia madura. Quem disse isso foi a Seccional da OAB do Paraná (OAB-PR), na última sexta-feira (15).

Um tribunal supremo não deve governar, legislar ou perseguir adversários políticos. Deve, antes, limitar-se a arbitrar conflitos constitucionais de forma imparcial. Entretanto, os ministros assumiram o papel de atores políticos, disputando espaço com o Congresso, o Executivo e até mesmo com a sociedade civil.

Essa hiperexposição fragiliza a imagem da Corte e cria a sensação de que os ministros não se orientam pela Constituição, mas por suas convicções ideológicas e por alianças momentâneas. O próprio Ministro Luís Roberto Barroso afirmou que o Supremo é um “braço” político no Brasil. Essa infeliz declaração foi em 05/07/2023, na abertura do 7º Encontro do Conselho de Presidentes de Tribunais de Justiça no Brasil.

Esse ativismo político não surgiu do nada. Ele é fruto de uma combinação perigosa entre vaidade pessoal e ausência de limites institucionais.

Muitos ministros se veem como iluminados, portadores de uma missão quase messiânica de salvar a democracia brasileira.

Ocorre que democracia não se salva com arbítrio, censura ou perseguição. Democracia se salva com respeito às regras do jogo, com equilíbrio entre os poderes e com garantias individuais asseguradas. Ao se colocar acima do Congresso, ao desautorizar o Executivo e ao intimidar opositores políticos, o STF mina justamente a democracia que diz proteger.

O resultado desse comportamento é devastador. O cidadão comum já não enxerga no Supremo uma instância de justiça, mas um tribunal de exceção.

A confiança na imparcialidade da Corte se desfaz, e com ela se esvai o respeito pela própria Constituição. Esse desgaste compromete não apenas o presente, mas o futuro da democracia brasileira. Afinal, se a Suprema Corte não respeita os limites constitucionais, por que outros órgãos do Estado deveriam respeitar?

A lógica da força substitui a lógica do direito, e o país se aproxima perigosamente de um estado de exceção permanente.

Não é tarde para reverter esse quadro, mas exige coragem. O Senado, que tem o papel constitucional de fiscalizar o STF, precisa assumir sua responsabilidade histórica. É inadmissível que ministros continuem a agir sem freios, ditando os rumos do país como se fossem líderes políticos eleitos. Também é urgente que a sociedade civil volte a exigir de suas instituições respeito à Constituição, pois a liberdade de todos está em jogo.

O Brasil não precisa de ministros que se comportem como candidatos. Precisa de juristas de verdade, comprometidos com o texto constitucional e conscientes de que sua autoridade decorre da lei, e não da própria vontade. Enquanto a Suprema Corte continuar a confundir justiça com política, a democracia brasileira continuará a definhar, vítima da arrogância e da incompetência de seus guardiões.

Autor

  • Sobre o autor

    Léo Vilhena é fundador da Rede GNI e atua há mais de 25 anos como jornalista e repórter, com passagens por veículos como Jornal Unidade Cristã, Revista Magazine, Rede CBC, Rede Brasil e Rede CBN/MS. Recebeu o Prêmio de Jornalista Independente, em 2017, pela reportagem “Samu – Uma Família de Socorristas”, concedido pela União Brasileira de Profissionais de Imprensa. Também foi homenageado com Moções de Aplausos pelas Câmaras Municipais de Porto Murtinho, Curitiba e Campo Grande.

    Foi o primeiro fotojornalista a registrar, na madrugada de 5 de novembro de 2008, a descoberta do corpo da menina Raquel Genofre, encontrado na Rodoferroviária de Curitiba — um caso que marcou a crônica policial brasileira.

    Em 2018, cobriu o Congresso Nacional.

    Pai de sete filhos e avô de três netas, aos 54 anos continua atuando como Editor-Chefe da Rede GNI e colunista do Direto ao Ponto, onde assina artigos de opinião com olhar crítico, humano e comprometido com a verdade.


    "Os comentários constituem reflexões analíticas, sem objetivo de questionar as instituições democráticas. Fundamentam-se no direito à liberdade de expressão, assegurado pela Constituição Federal. A liberdade de expressão é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, inciso IV, que afirma que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato"


    NOTA | Para ficar bem claro: utilizo a Inteligência Artificial em todos os meus textos apenas para corrigir eventuais erros de gramática, ortografia e pontuação.

error: Content is protected !!
Rolar para cima